Mulher Alfa
Um híbrido novo circula pelas grandes cidades do Brasil e do mundo. É uma mistura entre dois tipos conhecidos, mas até há pouco tempo inconciliáveis. Essa nova espécie é encontrada apenas entre as mulheres e vem sendo observada com admiração, respeito, esperança - e, em alguns casos, com certo receio. Trata-se de uma combinação entre a figura da feminista clássica, aquela surgida nos anos 60, que, para conquistar espaço e independência, teve de ser durona, agressiva e por vezes masculina, e a "mulherzinha" dos anos 90, personificada pela personagem Bridget Jones, que queria arrumar um companheiro bacana, manter o corpo em forma, ir à manicure uma vez por semana e comprar muitos pares de sapato sem medo de ser tachada de perua.
Essa nova espécie é a mulher alfa, uma feminista feminina, criatura nascida para ser líder, dona de uma segurança e uma auto-suficiência sem precedentes, competente na vida acadêmica e no universo profissional. Um tipo de mulher que nasce pronta para enfrentar tudo, capaz de admitir que precisa, e gosta, dos homens - mas capaz, também, de viver sem eles. Uma mulher vaidosa, que gosta de cuidar de si e de ser admirada pela beleza, sem risco de cair no estereótipo da futilidade. A mulher alfa tem potencial para mudar a estrutura do casamento, da família e do mercado de trabalho. E já há quem sustente que ela vai dominar o futuro.
Essa é a tese do livro Alpha Girls (Meninas Alfa), que acaba de ser lançado nos Estados Unidos. Escrito por Dan Kindlon, psicólogo e professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade Harvard, o livro transporta para o universo feminino um termo conhecido da biologia animal: o macho alfa - o mais forte do bando, que lidera os demais, consegue os melhores alimentos e as melhores fêmeas. Para Kindlon, entre os seres humanos esse papel caberá, muito em breve, às mulheres. No livro, ele reúne entrevistas, estudos e estatísticas sobre a nova geração de meninas americanas, com idade variando entre 15 e 20 anos, e afirma que elas estão mais bem preparadas para cair no mundo que os meninos (leia a entrevista na seqüência da matéria). Kindlon não está só - e as idéias sobre a mulher alfa não se restringem às moças da sociedade americana. Recentemente, o filósofo francês Gilles Lipovetsky cravou que este será o "século da mulher-sujeito", aquela que é senhora da própria vida. Em seu livro A Terceira Mulher, Lipovetsky escreve: "Nenhuma transformação social de nossos tempos foi tão profunda, rápida e rica de possibilidades futuras quanto a emancipação feminina". E acrescenta: "A situação presente é marcada por tal defasagem entre as qualificações das mulheres e sua posição hierárquica que a pressão para o topo é quase inevitável".
"Elas vão mudar a estrutura das famílias"
A TEORIA EM CASA O pesquisador Dan Kindlon é pai de duas adolescentes, de 17 e 14 anos |
ÉPOCA - Quais as principais características das meninas alfa?
Dan Kindlon - Elas não têm dúvida sobre a própria capacidade, são muito bem-resolvidas. Não vêem os homens como inimigos, querem coexistir com eles. Para as alfa, a igualdade entre os sexos é um fato. A hipótese de que a mulher pode ser considerada inferior nem passa pela cabeça delas.
ÉPOCA - Que mudanças levaram ao surgimento das meninas alfa? Kindlon - A mudança mais importante é o fato de terem nascido numa sociedade que já é razoavelmente igualitária. Nunca houve tantas mulheres em cargos importantes, em nenhum outro momento da História. Nos Estados Unidos, as mulheres podem se alistar no Exército, competir profissionalmente nos esportes, entrar em qualquer universidade. Pela primeira vez, temos uma mulher na presidência da Câmara (Nancy Pelosi). Essas garotas cresceram num mundo onde isso existe, não está mais em fase de conquista. É claro que ainda há domínio masculino em diversas áreas. Mas o ponto de partida das alfa é o equilíbrio. Tudo é fruto das conquistas feministas, que trouxeram mudanças na legislação, na família e no mercado de trabalho.
ÉPOCA - Quais mudanças essas meninas farão no futuro?
Kindlon - As estatísticas mostram que, dentro de 30 ou 40 anos, as mulheres vão dominar o campo da medicina, como já acontece na psicologia. À medida que passarem a ocupar mais espaço nas universidades e nos cursos de pós-graduação, receberão salários melhores e terão mais poder aquisitivo. Esse poder será decisivo, poderá mudar a estrutura das famílias. Os homens passarão mais tempo em casa, cuidando das crianças, porque suas mulheres terão salários iguais ou melhores que os deles.
ÉPOCA - Em seu livro, o senhor destaca a importância do pai na vida das meninas alfa. Por quê?
Kindlon - É preciso considerar que a maioria dos cargos de poder ainda pertence aos homens. Portanto, se uma menina é admirada e incentivada pelo homem mais poderoso de sua infância, isso a deixa extremamente confiante. Além disso, o estreitamento da relação pai-filha ajuda as meninas a conhecer e entender as características tradicionalmente ligadas aos homens. No passado, essa relação era mais distante, e as meninas não tinham acesso ao universo masculino. Hoje, elas podem ser duronas ou dóceis, flexíveis ou inflexíveis, de acordo com a necessidade. Nesse aspecto, os meninos estão em desvantagem, porque ainda têm vergonha de explorar características femininas.
fonte http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDG76795-6014-462,00-ELAS+VAO+MUDAR+A+ESTRUTURA+DAS+FAMILIAS.html